Saber quando e como utilizar as avaliações ocupacionais é essencial para a identificação e controle dos agentes de risco no ambiente de trabalho.
Era manhã de 15 de janeiro de 2021 quando um trabalhador fazia a limpeza de resíduos químicos de um tanque de dois metros de profundidade em uma empresa de cromação e niquelação de metais na capital paulista. Durante o trabalho, o homem, de 53 anos, inalou gás tóxico, perdeu os sentidos e caiu dentro da estrutura. Ao tentar ajudá-lo, outros dois colegas, de 40 e 25 anos, também foram intoxicados e morreram no local. Uma quarta vítima, de 24 anos, faleceu no hospital e outros quatro foram internados. Em depoimento à polícia, a proprietária da empresa disse que todos utilizavam equipamentos de proteção como máscara, luvas, botas e aventais durante a ocorrência. Acidentes como este e outros tantos que vitimam trabalhadores no país chamam a atenção para a necessidade de uma correta avaliação dos perigos que rondam os ambientes laborais, constatando sua presença e chegando a conclusões quanto a sua magnitude, o que provavelmente não foi feito neste caso em São Paulo. Se as consequências provocadas pelo contato com os produtos químicos fossem conhecidas e as medidas de controle adotadas fossem suficientes para a proteção daquela exposição, o desfecho poderia ter sido outro. E é justamente para conhecer e eliminar esses perigos químicos e outros físicos e biológicos, presentes nas jornadas de trabalho, que os profissionais de SST realizam a avaliação, que pode ser qualitativa, semi-quantitativa ou quantitativa. Além de conhecerem profundamente as diferenças entre cada uma delas, o desafio é saber quando e como utilizá-las. Uma tarefa que requer muito estudo, conhecimento técnico e prática profissional.
A primeira, qualitativa, consiste, a partir do julgamento profissional, em uma análise baseada em observações técnicas, experiências anteriores ou modelos. É aquela em que se realiza a identificação do risco que pode estar presente no ambiente, sem que seja atribuído um valor para provar que ele realmente está no local de trabalho. Já as avaliações quantitativas, de acordo com a engenheira civil e higienista ocupacional, Berenice Isabel Ferrari Goelzer, são mais complexas e sua interpretação se baseia, por exemplo, na comparação de estimativas de concentrações ambientais de contaminantes atmosféricos ou em resultados de medições de agentes físicos, com valores limites de exposição ocupacional (LEOs) recomendados e/ou legalmente adotados, com base em dados científicos. E, neste caso, conforme o Técnico em Higiene Ocupacional Certificado pela ABHO (THOC 0052), tecnólogo em Gestão Ambiental e técnico de Segurança do Trabalho, Marcos Sell, há parâmetros definidos, como os Anexos I e III da NR 9, que tratam, respectivamente, sobre os limites de exposição à vibração e ao calor; a NR 15, que indica limites de tolerância para as atividades consideradas insalubres; os previstos pela ACGIH (American Conference of Governmental Industrial Higyenists); e as NHO (Normas de Higiene Ocupacional da Fundacentro). Há, ainda, recomendações como a publicação da AIHA (American Industrial Hygiene Association), recentemente traduzida pela ABHO com o título. Uma estratégia para avaliar e gerenciar – Exposições ocupacionais, além de um dos documentos mais utilizados quanto a Limites de Exposição Ocupacional da ACGIH, também traduzido e publicado pela ABHO: 2022 TLVs e BEIs.
ETAPA
Antes de se deter, porém, na metodologia, os prevencionistas chamam a atenção de que a avaliação não pode ser considerada como um fim, mas como uma etapa de um processo muito mais amplo que, de acordo com Berenice Goelzer, começa com a percepção de que um certo agente, capaz de causar prejuízo à saúde, pode estar presente num certo ambiente de trabalho, e que termina com a prevenção ou controle da exposição dos trabalhadores a este agente. “Na prática da Higiene Ocupacional, a etapa de avaliação deve ser precedida de reconhecimento de riscos bem-feito, e, no caso de serem constatados riscos, isto só tem significado se servir de base para sua prevenção e/ou controle”, esclarece.
O processo de conhecimento, julgamento e gerenciamento das exposições, na visão do engenheiro mecânico e de segurança e higienista ocupacional certificado (ABHO HOC 0050), Mario Luiz Fantazzini, é contínuo e inicia no reconhecimento dos ambientes, do processo, das funções e tarefas, e dos agentes. Essa fase, conforme o higienista, se chama caracterização básica e é preconizada pela AIHA há muitos anos. “Durante o processo, podem ocorrer avaliações dos agentes, qualitativas e/ou quantitativas. O profissional deve optar entre várias abordagens, que dependem das características da situação encontrada, a qual pode demandar ações de controle imediatas, avaliações qualitativas preliminares ou mesmo avaliações quantitativas”, elenca. Na maior parte dos casos, para Fantazzini, as avaliações quantitativas são fundamentais para o julgamento consolidado da situação de exposição. “Todavia, os estágios intermediários de avaliação e julgamento não impedem que se tomem ações de controle e isso sempre esteve bem claro no antigo PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais), como continua válido no PGR (Programa de Gerenciamento de Riscos) da NR 1”, destaca o higienista.
TIPOS DE AVALIAÇÕES
As avaliações para identificação dos agentes de risco no ambiente de trabalho podem ser:
- Qualitativa – compreende uma observação técnica, levando em consideração a experiência dos trabalhadores, de avaliação dos riscos presentes no ambiente, sem a utilização de equipamentos para a realização de medições e sem metodologias semiquantitativas, mas que permitem ao profissional agir para a mitigação da exposição.
- Semi-Quantitativa – um método que proporciona a hierarquização dos riscos e estima se estes são aceitáveis ou se necessitam de medidas urgentes e imediatas. É baseada na magnitude do risco profissional, a partir da estimativa da frequência do risco e da gravidade possível das lesões.
- Quantitativa – uma avaliação por instrumento, em que é atribuído um valor de concentração ou intensidade ao agente, para dimensionar a exposição ocupacional dos grupos de trabalhadores, comprovar o seu controle e subsidiar o equacionamento das medidas de prevenção. É importante para fins de laudos técnicos, periciais e caracterização de insalubridade
Seja qual for a metodologia adotada nas avaliações ocupacionais, se através destes exemplos citados pela reportagem ou de outros existentes, o certo é que os profissionais de SST devem sempre ter em mente que este processo é considerado como um meio, uma das etapas para a identificação e o controle dos agentes de risco no ambiente de trabalho. Um caminho que deve ser conduzido com atenção às constantes atualizações na área de Higiene Ocupacional e muito estudo.
Autor: Marla Cardoso
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